17 de mar. de 2011

O Diário de Rodrigo


Capítulo V - Aproveite bem o Tempo!




Nesse tempo, mesmo com um cara andando pela casa volta e meia, já me sentia bem a vontade no meu canto. Como sempre convivemos juntos desde moleque, eu e o Hugo já partilhávamos de um nível de amizade mais alto, e por consequência uma intimidade também. A cada dia, nos conhecíamos mais e melhor. Sabíamos das manias, das qualidades, defeitos e pontos fracos de cada um. E um dos pontos fracos do meu camarada era se envolver fácil demais com as pessoas. - mais precisamente com a mulherada. Até ai, tudo legal que o cara namore, não fique curtindo solidão - muitas vezes assim como eu insisto em fazer. O real problema disso tudo era que o cara se comportava como um capacho, daqueles com "C" maiúsculo. Se dedicava ao máximo, dava tudo o que podia ou não podia. Beirando o ridículo na maioria das vezes. Em alguns episódios era visível a diferença de sintonia entre o mesmo e suas ditas namoradas. Sinceramente como espectador forçado disso tudo, não me metia.
Deixo rolar. Do contrário, só me manisfestava quando o cara me pedia um conselho e era o momento em que falava mesmo na lata tudo o que achava da situação - que não foram poucas por sinal. Algumas vezes chegava a ser duro, mas falava. É uma das minhas características. E de tanto que falei essa tal de verdade que insiste em visitar minha mente e se propagar em minha língua, atualmente ele nem tem namorada. Só tem amor mesmo por uma agenda amarela repleta de números de "SOS feminino" - ou seja, as várias que segundo ele conheceu bem nas baladas da vida noturna. Incrível mesmo era que com apenas um único telefonema a pessoa já tinha um programa pra qualquer horário. Caramba, quando crescer também quero ser assim. Brincadeira.
Nesses dias, passei trabalhando muito, ocupando a cabeça. Enquanto isso, meu coração se mantinha fechado mais e mais a cada dia. Não curto muito esse estado, mas era como me sentia. Em uma noite em especial, percebi o quanto me encontrara mergulhado nas lembranças de coisas que nem vivi direito, nas frustrações, nos desamores. Voltando da faculdade, sozinho, falando sozinho pelos cantos, senti o vento da noite enluarada cortar minha pele. O ar em movimento parecia tocar meu coração e espalhar o vazio que em mim habitava. Começara a me preocupar isso tudo. Sabe, quem participa de minha vida e me vê nesse estado pensa que não quero sair dessa. Que só me lamento pelas coisas do passado ou das minhas inseguranças. O que não é uma verdade inteira. Desejo muito encontrar alguém para contar como foi o dia, que segure minha mão ao andar pela rua, pra chamar de meu amor e sair todo feliz por sentir que tem alguém que ame de verdade ao lado. Talvez me sentisse mais protegido.Proteção de algo que nem ao menos sei o que é, mas que apenas temo. No silêncio da minha casa, quase não durmo direito, não sei como faço pra me levantar a cada manhã. Mas tenho fé. Fé, de que tudo isso vai passar. Andando no caminho pra casa depois da faculdade como estava dizendo, sentei no mesmo banco da praça a esperar o mesmo ônibus, no horário de sempre.
Não demorou muito e já estava acomodado numa poltrona emborrachada do coletivo, uma chuva fina caia como um véu sobre as luzes da rua. As pessoas permaneciam num silêncio sem igual, característico de um dia cansativo de trabalho e de estudo. Volta e meia quebrado pelos toques de celulares nervosos e conversas extensas ao pé do ouvido. Eis que surge em uma das paradas um jovem rapaz, bem vestido até, provavelmente retornando de alguma igreja da região. Tinha uma voz firme e com esse instrumento distribuia aos passageiros um pequeno panfleto religioso. A primeira olhada, pensei veemente em recusar, mas como num estalo, decidi aceitar e ler o que estava escrito no papel. Pensava assim: "no que poderia um pequeno papel desse de tão mal que não poderia me dar ao trabalho de ler e pensar?"
Bingo. O panfleto trazia a seguinte mensagem:
"Ontem jamais voltará; amanhã pode não vir; o que temos é o agora. Não fique lamentando os erros do passado. Nem de preocupe com o que possa acontecer amanhã. O ontem já escapou de nosso controle. O futuro é desconhecido. Concentre-se naquilo que você pode fazer agora. Um hoje é mais valoroso que dois amanhãs. As suas decisões do presente vão garantir a felicidade ou a desventura no tempo que há de vir..."
O restante da frase era um convite para aceitar Jesus em sua vida e visitar, conhecer uma igreja da região. Bom, como aspirante a publicitário, meus olhos estão começando a ser treinados a avaliar e perceber detalhes mínimos de anúncios assim. A cor eu mudaria, o tipo de papel também. Notar quantas fontes tinham sido utilizadas, se a imagem de fundo estava em boa qualidade ou ao menos se a diagramação estava adequada. Fora isso... percebi quanto tempo perco em meus pensamentos solitários ao invés de viver plenamente minha vida e minha juventude. Desde então passei a dar um ponto extra pra minha intuição, e quando sentir vontade de fazer alguma coisa, o faço. Será que alguém ainda olha por mim? O título do panfleto só pra constar era: " Aproveite bem o Tempo!"

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